VAMOS
PASSEAR?
Serve
este convite para vos falar sobre os Passeios.
Refiro-me aos passeios que temos em Portugal, aqueles que fazem parte da nossa
via pública e que existem em todas as nossas Cidades e Vilas. Carinhosamente,
vou batizá-los por ‘os Nossos Passeios’.
Os
‘Os Nossos Passeios’, na sua
essência, não servem para quase-nada! É verdade, quase ninguém os usa. Não
foram feitos para serem usados pelas pessoas. Um destes dias estava a ver
televisão e a minha atenção despertou para um anuncio que dizia, entre outras
coisas, que: ‘podem tirar-me o fado, podem tirar-me a visão, podem tirar-me a
calçada, podem até tirar-me a fala, mas não me tirem o azeite…’ Só depois
percebi, que não era verdade, de facto ninguém queria remover a velha calçada,
muito pelo contrário, tratava-se apenas de uma técnica de comunicação que
apelava à nostalgia pela positiva.
A
tradição da calçada, evidenciada na pavimentação de mais de 90% ‘dos Nossos Passeios’ é, segundo alguns,
mais uma das montras vivas representativas da nossa cultura centenária e que
devemos manter, no mínimo, por mais mil anos! Eu penso exatamente o
contrário. Eu digo com toda a convicção, que ‘os Nossos Passeios’ são um contribuinte para a exclusão.
Excluem quase tudo e quase todos.
Excluem quase tudo e quase todos.
Diariamente,
nos locais mais diversos, todos nós vemos pessoas a caminhar à beira ‘dos Nossos Passeios’ ou, dito de outra
forma, pela beira da estrada.
É verdade.
As pessoas escolhem, naturalmente, os
caminhos que consideram mais adaptados à sua locomoção. Infelizmente, ‘os Nossos Passeios’ não têm essa
característica fundamental. O problema complica-se ainda mais quando pensamos
nos cidadãos com mobilidade reduzida, nos pais com os carrinhos de bebés, nas
pessoas mais idosas ou mesmo nas mulheres portuguesas que arrisquem o uso de
sapatos de salto alto. Por isso os vemos todos os dias a caminhar na estrada,
na direção dos automobilistas, colocando a sua vida, e a dos outros, em risco.
Os deficientes motores, que necessitam de se deslocar em cadeiras de rodas,
acabam por ser obrigados a converter-se em condutores de ligeiros sem
matrícula, muito provavelmente, sem carta para o efeito. Não me lembro de
encontrar no novo código da estrada, normas que contemplem esta evidência.
Afinal existem mais duas grandes categorias de veículos para além dos pesados e
dos ligeiros, a saber, as cadeiras de rodas com motor e as cadeiras de rodas
sem motor!
Mesmo
assim, quando ‘os Nossos Passeios’
têm a dimensão adequada, coisa rara, acabamos por encontrar de quase tudo a
bloqueá-los: árvores, paragens de autocarro, ecopontos, obras, cabines
telefónicas, postes de eletricidade, sinais de trânsito, etc. Propositadamente,
não me referi aos carros estacionados em cima dos passeios. Esse é um problema
que depende apenas do nosso civismo ou da falta dele e, somos nós enquanto
cidadãos, que o temos de resolver. Contudo, acredito seriamente, que as
Policias e as Entidades Fiscalizadoras poderiam ajudar, se é que não há nenhum
exagero neste tipo de pedido!
Ainda assim, e no meio de tantos obstáculos, acaba por ser a velha e desadequada ‘calçada portuguesa’ o maior dos inimigos. Um contratempo desnecessário e dispendioso. Surgiu no século XIX e é cada vez mais atual, muito embora já estejamos no século XXI.
É
um piso geralmente desnivelado, que se baseia em pedras de formato irregular,
geralmente de calcário e por vezes pontiagudas, intervaladas com buracos de
maior ou menor dimensão. Desnivelado porque na grande maioria dos casos nem se
dão ao trabalho de nivelar o terreno e, com muitos buracos, porque também não
se dão ao trabalho de os compactar devidamente. É, certamente, um piso
excelente para algumas modalidades radicais mas, fica muito aquém de oferecer a
segurança e o conforto necessários a quem se atreva a pisá-los sem usar
equipamento adequado. As cadeiras de rodas só poderiam circular se os pneus
fossem idênticos aos dos tratores uma vez que não existem, ou não conheço,
outro tipo de equipamento que seja viável para o efeito.
Mas, alguns, são bonitos.
Formam padrões decorativos pelo contraste entre as pedras de distintas cores, normalmente, o branco, o preto, o marrom e o vermelho. Bonitos mas inúteis.
Não sou nem tenho que ser contra este tipo de Decoração.
Considero sim que devem coexistir alternativas ou então, fazê-lo apenas nas grandes praças e nunca nos Passeios ou nas zonas pedonais comuns.
Quem tem responsabilidades nesta área devia olhar para os outros países da Europa e perceber porque é que as pessoas usam, de facto, os passeios!? É fácil, até pela televisão se percebe que os passeios na maioria dos países da comunidade não são como ‘os Nossos Passeios’, são Passeios a sério.
As pessoas usam-nos das mais variadas formas: caminhando,
de bicicleta, de patins, etc e os que têm mobilidade reduzida não encontram
obstáculos. Criamos tantas comissões neste país que, me atrevo a sugerir, que
criem a Comissão de Análise para os Passeios do Sec.XXI. O trabalho a
desenvolver é simples: basta viajar, olhar com atenção e tirar notas. Temos que
repensar ‘os Nossos Passeios’ para
evitar os erros cometidos e que continuamos a cometer.
"Não
uso o ‘Nunca’ nem o ‘Para Sempre’ mas tenho quase a certeza que, tal como não
consigo deslocar-me na minha cadeira de rodas em sítios como o Parque das Nações" - por muitos denominado como o 'Parque das Pedras' - "também já não será no meu tempo de vida que
vou usufruir dos ‘nossos Nossos Passeios’".
Lamento.
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